14 de ago. de 2009

Thaipusam

Mauro, seus gatos pretos me lembram de superstições e talvez não há nada mais ligado à superstição do que um bom despacho. (sim, galera, eu sei que despacho não é superstição, mas é.)

Onde vivo, em Singapura, é a terra do despacho. Situada na confluência de várias culturas, o bom daqui é que tem feriado religioso todo mês. Uma dessas festividades da religião Hindú (sim há milhares de hindus aqui em Singa) é a festa de Thaipusam, onde homens põem a sua coragem à prova ao sofrerem mutilações no corpo...O pensamento é o seguinte: se a dor ocorre na superfície da pele, então o medo também é superficial. Thaipusam é um ritual de coragem, contra o medo.

As imagens que captei (com a ajuda de uma amiga artista daqui) me lembram oblíquamente dos objetos sensoriais da Lygia Clark. Clark estava interessada na psicologia e as sensações dos objetos em contato com o corpo, com a pele. Sua proposta não era perfurá-la, nem mutilá-la - em suma, a onda de Lygia não era penetrar o corpo com objetos (já que propunha não-objetos!), mas fazer com que o contato com objetos sensoriais transformassem a mente.


Fora os ganchos e os espetamentos de pele, existe uma relação entre comida e despachos que vi claramente no Thaipusam...há sempre um alimento envolvido no ritual, e neste-caso, o homem-limão e o homem-laranja abaixo. É claro que estas frutas possuem caráter simbólico para a religião. Um despacho qualquer, de certa forma, é como se fosse uma refeição para os deuses, uma oferenda de enriquecimento para 'agradar' ao deus que em retorno lhe ajudará com suas benesses. A comida também é símbolo do corpo: o sangue-vinho e a óstia-corpo de Cristo, o charuto-cachaça-farinha do candomblé, o banquete miniatura que os Balineses oferecem aos seus deuses...Tudo isso é energia para consumo das divindades, insaciáveis divindades que aparecem na Terra numa atitude de comi-bebi-nada-mais-me-prende-aqui.

Esteticamente, adorei as costas do rapaz cheia de limões...é lindo, nojento, e sim, haja coragem para aguentar a dor de 1 kg de limões pendurados em ganchinhos fincados na própria pele. Talvez só seja preciso de 1 kg de limões para ser herói.

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